Imagine um bairro criado em 1982. Os primeiros moradores, vieram da Bahia e de Minas Gerais buscando oportunidades de emprego. A história do bairro é marcada pela luta por direito a terras que não eram ocupadas, onde tiveram suas primeiras casas construídas, seguidas de ordens de despejo e demolição. E foi a partir deste momento que os moradores que queriam residir ali travaram uma luta incansável para ganhar o direito à ocupação regularizada das terras. Mas não para por aí, eles também lutaram para ter acesso a água, luz, saneamento básico e entrega de correspondências. Eu estou falando do surgimento do maior bairro de Cariacica: Nova Rosa da Penha.

Talvez você nunca tenha ido até lá ou sequer ouviu falar sobre e, se ouviu, certamente se deparou com notícias negativas nos jornais sobre tráfico ou assassinatos. Eu poderia escolher falar sobre qualquer assunto neste artigo. Mas hoje escolhi escrever sobre a realidade que eu vivo cotidianamente.

Toda vez que eu tenho a oportunidade de ir a Nova Rosa da Penha, eu me sensibilizo. Não, não é porque é um bairro periférico com alto índice de vulnerabilidade social. Não. Não é pelo fato do noticiário evidenciar tantos problemas existentes ali. Não. Não é sobre dar voz a quem não tem voz, mas sim de ouvir as vozes que já existem naquele local. E eu tenho o privilégio de ouvir essas vozes todos os dias e talvez o que mais me sensibilize – estas vozes não se queixam, nem se colocam como vítimas de suas próprias histórias. Estas vozes tem muito a dizer.

As vozes que ali existem conseguem ecoar o sentimento de mudança. E elas não permitem que suas histórias sejam limitadas apenas pela visão negativa vista de fora. Muito pelo contrário, os moradores utilizam da cruel realidade como um combustível diário para modificar o meio que estão inseridos, lutando em prol de novas oportunidades. E o combustível que eles utilizam e apostam todas as suas energias e esperança se dá através do esporte e da cultura.

O bairro possui mais de 30 projetos sociais voltados para o esporte, através do futsal, jiu-jitsu, judô, ginástica rítmica e para a música, com aulas de instrumentos musicais e canto/coral. Mas aí você deve estar se perguntando: como projetos sociais são capazes de modificar a realidade de um bairro periférico?

O esporte e a cultura são dois caminhos viáveis – e comprovados – para a ascensão social. Não estamos aqui falando se este indivíduo irá se tornar ou não um atleta ou um artista famoso, mas sim na possibilidade que ele terá de aprender valores importantes para a convivência em sociedade que o guiarão para sua formação cidadã, criando novas perspectivas para que busquem caminhos diferentes do que os que estão acostumados a ter acesso.

Diante deste contexto, remeto a frase de Ayn Rand: “Aprenda a valorizar a si mesmo, o que significa: lute pela sua felicidade”. E os moradores de Nova Rosa da Penha lutam tanto que são capazes de contagiar e sensibilizar, sensibilização esta que me motivou a escrever este artigo. Essa luta não vem de agora, vem desde a ocupação do bairro, há 39 anos atrás. E eles são incansáveis na busca por melhorias e reforçam isso, com a sensação de pertencimento ao bairro. Os moradores estão tão engajados em escrever um novo futuro que lutam dia após dia na busca pelo melhor e na possibilidade de enxergar novos sonhos para os seus filhos, netos, sobrinhos, vizinhos, para que estes conquistem suas liberdades – de expressão, financeira, cultural e intelectual.

Não se trata de ignorar os problemas existentes, mas sim de enxergar novas possibilidades para promover a transformação social de uma comunidade vulnerável. Estou falando de moradores que, em meio a tantas adversidades, conseguem enxergar um futuro digno para as próximas gerações.  Que veem com orgulho a trajetória e evolução de um bairro.  Não, eu não estou falando de um simples projeto social, mas sobre reescrever o futuro. É sobre acreditar. É sobre cuidado, coragem, respeito e empatia.